Superação, convivência, descobertas, amores e desafetos, compras, dálmatas, praias, caveiras e lagoas. Tudo isso e muito mais na terceira - e última - parte do "Viajando nas Trilhas" de Virgínia França e amigos.
Da esquerda para a direita: eu [Virgínia], Marcelo e Gabi. Na trilha de Serrambi-Maracaípe.
Parte 3
Muitas habilidades tomam parte na atividade de fazer trilhas. Além das físicas, que são óbvias, como resistência, força e disposição, também são requeridas nas aventuras a paciência, a empatia, a tolerância e a persistência. E veja bem, quando menciono essas nossas competências humanas, isso não quer dizer que pra fazer trilha seja necessário tê-las já prontas e acabadas em si mesmo. Que nada, as trilhas são ótimas oportunidades para treinar e/ou desenvolver essas capacidades. Afinal, toda e qualquer atividade em grupo exige de todos e qualquer um alguma flexibilidade, e de novo não falo só da física. Quanto mais heterogêneo for o grupo, mais chances ocorrerão de surpresas, das boas e das ruins. O que quero dizer, e minha experiência tem sido uma prova constante disso, é que, ao fazer trilha, você descobre novas perspectivas em relação a si mesmo e aos demais animais humanos. São tantas coisas que julgamos que não somos capazes de fazer; e aí na trilha, quando você vê, já foi. Às vezes, no início do processo, você olha aquela pessoa e pensa: “que cara chato!”, e, para sua surpresa, ao final do dia, vocês são melhores amigos. Grandes amizades e até casamentos podem surgir de uma trilha, como também é possível casais enamorados se desentenderem numa trilha. O fato é: ser trilheiro é dar o benefício da dúvida ao destino e torcer que ele proporcione as melhores coisas: clima bom e bons companheiros de trilha, com os quais você possa se divertir e aprender sempre.
Finalmente uma trilha de praia. Partindo de Serrambi (63 km de Recife) até Maracaípe (todas duas ficam no município de Ipojuca), apenas nove quilômetros de muito calor e uns cinco minutinhos de sombra, o chapéu era indispensável.
Que Móises que nada, melhor que abrir o mar é cruzar o rio por esse caminho. Foto: Marcus Henauth.
Saímos da área urbana de Serrambi, atravessamos o rio por uma espécie de passarela e seguimos por estradas de terra em meio a propriedades rurais. Teve gente que comprou caju (é muita disposição caminhar carregando compras). Um casal de trilheiros levou o cachorro, uma dálmata chamada Monalisa que ficava louca quando via uma galinha. Foi uma loucura só.
Um pedaço do grupo com Monalisa, a dálmata louca por galinhas. Foto: Virginia França.
Muito caminho depois, subimos uma ladeira íngreme, até a Igreja do Outeiro. Pausa para o lanche, fotos, olhadinha rápida no cemitério e contemplação da vista maravilhosa de Maracaípe. Depois de recuperar o fôlego, descemos em direção à última etapa: o mangue.
A vista do Outeiro. Maracaípe lá embaixo, nosso alvo. Foto: Marcelo Negromonte.
Quando alcançamos a margem do mangue, embarcamos em jangadas e aí foi rio abaixo. Silêncio delicioso, ventinho gostoso, sombra e, quando nos demos conta, chegamos ao Pontal de Maracaípe. Todos estavam renovados e prontos pra começar tudo de novo.
Deixar-se ir ao sabor do rio, apreciando o mangue. Foto: Virginia França.
O passeio de jangada ainda incluia a observação dos cavalos marinhos. Muito legal também a preocupação dos jangadeiros de que ninguém jogue lixo na água. Cada jangada tem um lixeiro. Essa trilha light terminou com banho de mar pra uns e cerveja e carangueijo pra outros. Mas todos com o gostinho salgado de uma trilha de praia.
Sol maravilhoso, mangue, praia, passeio de jangada e cavalos marinhos; tudo isso, só fazendo trilha. Foto: Marcelo Negromonte
A última trilha de 2009 foi para São Benedito do Sul (179 km de Recife), a cidade das cachoeiras. Depois de entrarmos na área urbana para pegar os guias locais, o ônibus nos deixou numa estrada entre canaviais, fizemos o alongamento e, sob um calor de lascar, começamos a trilha.
Celular não pega por aí. Além de cana-de-açúcar, o que pega mesmo é o calor!! Foto: Marcelo Negromonte.
O calor era tamanho e os obstáculos foram tantos que, quando nos deparamos com a primeira cachoeira, não deu tempo nem de tirar foto. Todos se jogaram para recuperar as energias e dar uma refrescada. Depressa, retomamos a trilha para chegarmos à próxima cachoeira (Peri-peri) com tempo pra aproveitar. Tomar muito banho e se energizar pra o ano-novo que tava chegando.
Cachoeira Peri-peri, pense num banho bom: água fria e bons fluídos. Foto: Marcelo Negromonte.
Os detalhes maravilhosos feitos pela natureza que uma trilha nos possibilita aproveitar. Foto: Marcelo Negromonte.
Para começar 2010 super bem, com aquele pique, nada como uma trilha de dois dias em dois estados diferentes. Primeiro Pedra da Boca (cidade de Araruna), na Paraíba, e, no dia seguinte, Baía Formosa no Rio Grande do Norte.
No Parque Estadual da Pedra da Boca (criado em fevereiro de 2000) a Pedra da Boca é a estrela principal, mas não a única; ela divide a atenção com a Pedra da Caveira. O forte por lá é o rapel, mas nosso modesto e pequeno grupo fez apenas uma trilha bem curtinha.
Olha o bocão da Pedra da Boca. Foto: Marcelo Negromonte.
Devido ao percurso pequeno, algumas pessoas disseram que seria uma trilha de vó. Só se for a avó do Indiana Jones! O que tinha de curta, compensava em dificuldade. Escalar uma parede, atravessar uma vala de pedra, um guia que não sorria, entrar em cavernas, se arrastar pelo chão e “nascer” da Fenda da Piriquiteira foram nossos desafios; e posso dizer com orgulho que o grupo deu show, passamos com garbo por todas as provações e ainda nos divertimos muito. Isso é que é trilha!!!!
Tinha a impressão que a qualquer momento a Pedra da Caveira ia perguntar se o He-man tinha ido conosco. Foto: Marcus Henauth.
Dormimos em Araruna, em uma pousada muito simpática que também é uma pizzaria (perigoso é se hospedar lá por muito tempo e engordar). O friozinho faz parte do encanto da cidade que fica numa altitude de 580 metros. Na manhã seguinte, fizemos a primeira trilha do dia, de ônibus, e passamos por uma cidade com o curioso nome de Passe-Fique. Não ficamos e encaramos um trecho terrível de estrada até Baía Formosa, onde chegamos cansados, de ônibus e estradas esburacadas, mas cheios de energia para a Trilha das Lagoas.
As lagoas eram lindas. A água tem uma coloração diferente, marrom, por causa da vegetação. Foto: Marcus Henauth.
Na primeira parte, molhamos os pés, e muito mais, em duas lagoas; depois subimos através da Mata Estrela, uma reserva de mata atlântica que termina na praia, pra onde descemos e percorremos o último trecho de nossa aventura. Água não faltou nesse dia, primeiro das lagoas e depois do mar.
Que aventura! Trilha em lagoa. Foto: Elvira Fernandes.
Nosso último trechinho foi pela praia, com direito a banho, ainda bem. Foto: Marcelo Negromonte.
Muito legal ter mata e praia numa única trilha. Agrada a gregos e troianos. Todos ficam cansados e satisfeitos. Trilha é isso, e que venham outras mais.
Virgínia França mora em Recife, é Filósofa (Mestrado em Filosofia pela UFPE) e professora universitária. Ela costuma realizar suas em trilhas com a empresa Cometa Aventura.
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